Ácido Ameno

Monday, February 25, 2008

|| (PAUSE)

Tenho aprendido ultimamente. Coisas pequenas. Boas e ruins. Pelo olfato e paladar, no sentido do instinto e do gosto. O azedo na boca. O ácido amargo das decepções. Mas sou um otimista, um pontinho brilhando no canto escuro do meu pessimismo. Como quero acreditar, continuo aprendendo...
Aprendo com os tolos a não ser tolo; com os miseráveis, a ser mais humano; com os egoístas, a não ser tão cego; e com os cegos, a desenvolver os sentidos. E comigo mesmo, a cada tropeço. Quando não vejo....
Hesito, em alguns momentos. Para ter êxito. Para pensar... paro.
Espero.


Penso e ando....


Tentei algumas coisas que, por não conseguir, parei de tentar. Coma induzido. Às vezes, é melhor flutuar que afundar. E isto não é estagnação. É pausa. Para se recompor e analisar erros.
Tenho tentado coisas que não consigo, apesar do esforço; enquanto outros conseguem sem esforço algum. Então entendo que esta é a natureza das coisas e brigar com a natureza apenas provoca sua ira, o que me causa danos e entristece. Então aguardo oportunidades. Fluirão naturalmente. Quero acreditar, pelo menos... Mas também é preciso aprender a enxergar. Dilatar a retina apenas entontece.
Beber para ampliar os sentidos? Apenas quando se está bem. Nos maus momentos, ampliar os sentidos é multiplicar erros. Suicídio. Como ingerir álcool - não o dos destilados, mas o comum, de cozinha -, deixar uma trilha até o intestino e colocar fósforo aceso na boca. Queimar por dentro.
Autocombustão por autocombustão, que seja involuntária...
Sei que amanhã não existe. Só o hoje. Mas se hoje o momento é de aprender, que assim seja. Aprenderei por todo o dia.
Aprender é agir em silêncio.

Sunday, February 10, 2008

LAMENTO FETAL

Resolvi
escrever e escrever,
como um louco,
para esquecer
quem me esquece,
como se eu fosse pouco...
maré sem vazão.

Mas como esquecer
algo bom
dentro do coração
em um mundo que explode,
sangrando
egoísmo e extorsão?
Jorrando imagens
que ferem a retina
e se tornam
apenas imagens
na rotina das feras,
mas que são, na verdade,
meu irmão e o seu,
vilipendiados e mortos,
seus corpos levados
pela maré da ambição.


Como pode
o sexo ser tão bom
e as drogas tão puras
quando
a música nova que ouvimos
da banda que explode
esconde o som
da granada
que transforma
o sexo, as drogas e a música
em nada?


Como podemos
sorrir logo cedo
se o medo
e a angústia de muitos
fazem redimir
a alegria de poucos ?
Como é possível,
nesta situação,
matar
algo bom
que bomba entre o sangue,
jorrando do coração ?


Como é possível ?


Devemos, então,
nos abster de música, sexo e drogas?
Fazer greve de fome ?
Usar camisetas brancas
ou com imagens fúteis
em passeatas inúteis
na Avenida Paulista ?
Não!
Nada disto encerra o pleito.
Mas também não devemos
matar algo belo
encerrado no peito.


O corpo
enterrado
pela poeira do vento
ou o feto
arrancado do ventre
pagarão
a miserável alegria
da nossa diversão?
Não!
Mas também não devemos
nos evadir
e deixar de sorrir.


Então...
o que devemos fazer?
Pegar em armas,
em nome da revolução?
E matar,
em nome
da nova nação?
Não!
Mas também não matar
algo bom que não morre
no altar sagrado do peito.


Mas, então,
onde está a solução?
Talvez
na abstenção
de consumo excessivo
de coisas duráveis
que não venham direto
do coração.

O alimento da alma
está ali.
O resto....
é apenas bulimia
e extensão.

MANUAL DE INSTRUÇÕES:

1) No metrô ou no trem
olhe profundamente
no rosto de alguém
que acabou de sentar
e menos
para a nova função "vibrador"
do seu celular.


2) Deixe
seu avatar desligado.
A função second life
se desconfigurará automaticamente.
Feito isso,
se olhe no espelho
e lave seu rosto.
Ele retomará seu lugar.


3) Use seu celular
para falar com pessoas queridas.
Códigos são para matemáticos
e pessoas credenciadas.
Em caso de dúvida
consulte o SAC -
Serviço de Atendimento ao Coração.


4) Seja feliz.

TV, vídeo,
câmera digital,
tela de cristal líquido,
combo alma + internet + speed
pelo preço de um.
Tudo encerrado
em um aparelho
de cinco centímetros.
Mas, espere...
onde está?
Em que bolso guardei
meus sentimentos ?


Uma propaganda antiga
justificava a agressão de alguém
em outro encostado
em seu carro novo.
A propaganda terminava
com o agressor
abraçado ao "seu bem".
Transmissão da moléstia
pela via intravenosa
da televisão.


Lembre-se:
o barril do petróleo
que alimenta
o motor do seu carro,
em algum outro lugar
também alimenta
a poeira do vento
com corpos.


Brindemos a isto!!!!



Como posso,
então,
matar algo bonito
que sinto
no coração?
Não!
Deus, Buda, Moisés
ou uma força maior qualquer
ensinou:
Não devemos matar.
Portanto,
deixe que eu cuido
deste tumor benígno
que insisto
em carregar no peito
e que médicos incompetentes,
formados em cursos
de curta duração
ainda chamam de amor.
Essa coisa
de velhos ultrapassados
que curtem vinil
e ouvem Neil Young.

"Hey, Hey, my, my,
Rock and roll can't never die",
seguido de tosse asmática.
Mas não!
Não o deixe morrer
dentro do peito.


Por outro lado,
a produção
e o consumo excessivo
injetam dinheiro
em veias capitalistas.
E, a cada dia,
sempre mais do que antes,
o vício monetário
se reflete em corpos
em terras distantes.


É preciso, então,
parar de consumir ?
Não!
Apenas deixar
a produção nos servir
e suprir
nossas necessidades,
em vez de seguir
as veleidades
da produção.


Menos é mais
Mais amor no coração
e menos efeitos
em objetos perfeitos
que atendem
necessidades inúteis
em sua concepção.

Minha inteligência artificial
comprada no EBay,
me lesa e me engana.
Dita apenas
o pouco que sei
com base
na ignorância humana.


Mas
se nesta noite
durmo
abraçado a meu celular
é apenas
porque espero
que vibre
com a ligação de alguém
que sei
que não vai ligar.


E quando
nos tornarmos presas,
correndo
em multidões loucas,
carros abandonados em ruas vazias,
atacados por raios UV
e a água for um produto escasso?
O que restará?
Pedir para William Gibson
nos transportar
para o cyberspaço?
E quando
as estrelas e a noite
se corromperem de dados
e tudo virar apenas
a outra face do dia?
Transferiremos
nossos corpos por e-mail,
usando
nanotecnologia?


Estaremos, ainda assim,
vivos, de algum jeito?
Não!
Ainda não é hora de matar
o que vive no peito.


Mas que fique, então,
claro como a luz clara do dia.
é preciso
não ser contra a tecnologia,
mas contra a desumanização,
que cria o distanciamento
que nos permite ver
guerras e mortes
como entretenimento
pela televisão.

E meus sonhos
que ainda passam, intocáveis,
pela lente dos olhos,
e se repetem, intocáveis,
por anos e anos,
ainda são,
pelo menos,
humanos...


Mas quando
a produção
de marcas e produtos
se multiplicar
e o ar se tornar raro e insalubre
e na multidão
de carne humana abarrotada
cada um sentir-se mais só.
O que restará?
Se autoconsumir
e virar pó?


Sinto algo morto no peito....